quinta-feira, 30 de junho de 2011

Diana (inspirando por uma das 27 de Rubem Fonseca)

Mais uma vez a Rafa tinha levado Diana pra uma daquelas festas chatas. Não sei qual tipo de atração ela sentia por aquelas pessoas, mas não eram as mesmas. Diana inventou alguma história e saiu mais cedo, disse que iria estudar, qualquer coisa. Resolveu tomar café no único boteco que estava aberto àquela hora. Talvez o vestido e a maquiagem fossem muito chamativos para o lugar. Sentou ao lado de um rapaz.

- Meu nome é Diana, e o seu?
- Manoel.
- Meu pai se chamava Manoel, meu avô se chamava Manoel, meu bisavô se chamava Manoel.
- E seu filho?
- Não tenho filho, tenho um cachorro. Também se chama Manoel, mas eu o chamo de Mane, ele prefere.

Era óbvio e ele sabia, ela estava mentindo.

- E você? Faz o quê?
- Nada, estou desempregado.
- E antes?
- Ainda desempregado. Mas sei desenhar.

Diana pegou um guardanapo e pediu para que ele fizesse um desenho. Desenhou um cachorro que disse que era o Mané. Mas era um vira-lata, legítimo, e o Mané não era assim. Guardou o desenho na bolsa.

- Sou maluca.
- Eu também.
- Estou falando sério. Sou ninfomaníaca. Sabe o que isso significa?
- Sei. Uma mulher que busca compulsivamente o orgasmo sem conseguir.

Aquela era definição muito simplista, mas não retrucou, provavelmente ele diria que era apenas simples, e que as definições mais simples são as mais corretas. Ela concordaria.

- Nós, as ninfomaníacas, somos pessoas impulsivas. Vemos um determinado homem e queremos levar ele para a cama. Vai me dizer que isso não acontece com vocês? Apenas para os homens é mais difícil satisfazer esse impulso, as mulheres resistem mais às investidas. Agora, se eu convidar você para ir para a cama comigo você não vai resistir, vai topar, não vai?
- Você bebeu?
- Bebi champagne na festa, mas lá só havia homens sem graça, e antes de escolher errado dei o fora.

Manoel pediu um café duplo. Ele não gostava de fazer sexo com mulher de porre. Depois foram para o apartamento dela. Não tinha porteiro e a cama era confortável. No outro dia Diana quis se levantar, mas não conseguiu.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Com lamentos, Eu

Era meu dia de folga na empresa. O dia sagrado, quinta-feira. Um solzinho regado com frio que implorava qualquer tipo de rendição que envolvesse minha cama e eu. Mas o telefone insistia em tocar. Já poderia sentir o cansaço de uma maratona caso eu levantasse e fosse até a sala só para atender. E se fosse cobrança? E se fosse de novo o carinha chato do bar de sábado tentando marcar uma segunda vez? E se fosse alguém do trabalho me pedindo pra cobrir horário? Deixei tocar. É por isso que não tenho mais celular desde que o meu caiu no vaso da faculdade. Mas naquele dia me arrependi.

Acordei mais tarde, lá por depois do meio dia, liguei a tv e chorei. O jornal transmitia ao vivo o resgate de um incêndio que acontecia num bairro próximo ao meu. Edifício Lisbela, sétimo andar, apartamento 31. Eu conhecia aquele lugar. Morei lá entre 2001 e 2005, depois vendi para um amigo de infância, o Luiz, que tinha acabado de se casar e estava com uma filha por vir. Lembro também da expressão de realização que se via nos olhos dele e da esposa. Sobrava até pra mim, mil agradecimentos e jantares por poder oferecer o apartamento como ninho, repouso, morada para tanto amor que ainda seria modelado entre aqueles poucos cômodos de paredes esverdeadas.

Corri até o telefone para conferir as chamadas perdidas. Era ele, era o Luiz. Tentei ligar desesperadamente e só ouvia o som assustador da caixa postal. Foi assim durante toda a primeira semana. Evitava ler os noticiários para não descobrir o pior. Preferia tentar e tentar, cada vez mais, até que meu amigo finalmente pudesse me atender.

Mas hoje, justo hoje resolvi dar uma olhada na caixinha de correio:

“Não aguentei, minha cara Lis. Meu patrimônio – que um dia também foi seu – foi transformado em cinzas. Meu peito foi transformado em restos. Minha alma dilacera entre lembranças e arrependimentos. Naquele dia saí de casa intrigado com ela, ciúme barato, falta de diálogo, talvez excesso de paixão. Busquei minha filha na escolinha e quando voltei os bombeiros já estavam tentando controlar as chamas. Disseram que ela entrou no banho e esqueceu o gás ligado, o fogo acesso. Mas descrever assim parece cena de um filme qualquer, como aqueles que a gente assistia com o pessoal depois do cursinho na casa dos seus pais.

Ontem Clarinha completou 5 anos, quando foi se deitar me contou que só pediu uma coisa na hora de cantar os parabéns: Papai do céu, que a estrelinha da mamãe brilhe mais forte lá de cima, mas que todos consigam ver, assim como todos percebiam que a felicidade entre a gente era límpida.

Resolvi me mudar com ela, crescer com ela, minha filhinha anda sofrendo mais que eu, que já sofri por tantas outras coisas em tantas outras situações. Ela é linda demais para sofrer.

Prometo visitá-la em breve e renovado. Espero que entenda minha recente ausência. Meu novo endereço mando junto com esta carta, caso você queira nos visitar também.

Mil abraços, Luiz.”

domingo, 12 de junho de 2011

Quando você voltou de férias

Ainda bem que parou de chover. Até chegar no restaurante eu teria que ter sorte pra conseguir um táxi. Aliás, em qualquer ocasião que envolva táxi é preciso de sorte. Posso contar nos dedos quantas vezes o motorista ouvia música boa. Mas fui, entre Fagner e Ney Matogrosso (respectivamente motoristas fãs da semana passada) eu já tinha aguentado o pior.

Não entendo como em uma cidade como esta, cheia de variedades gastronomicas, ainda há filas para conseguir uma mesa bem localizada. Eu prefiro na janela, já que se acontecer alguma coisa é só pular pra fora, mas ela disse no telefone que ventava muito - e concordei - e a decoração não era a mesma da última vez, as cortinas não lembravam os lençóis da infância. Então contei sobre como meus dias andam praticamente cheios, que cada mês parece passar mais rápido. Acho que abril teve 15 dias, no máximo. Ela comentava que diante de toda a liberdade do passado parecia meio estranho esse apego com a rotina de agora, mas não era algo que a incomodava. É liberdade merecida, e quanto mais se tem, menos quer parecer egoísta. A gente sempre gostava de dividir, nem se fosse um amendoim, a conta de luz, a banda, o espaço no banho.

Voltei pensando nos três segundos de paz instantânea que soa junto com aquele "estava com saudade" que ela sempre assopra com o lábio molhado de vida.

- Eu também, de verdade.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Feriado

Mas mesmo se sobrasse alguns abraços
Mesmo se me faltasse muito espaço
Até o pôr-do-sol mais calmo se guardaria para o fim

Eu já implorei para a cidade inteira
Que cessasse toda essa besteira
De que ela não caberia dentro de mim

Da janela que se abre para a fonte
Vê-se bem pra lá do horizonte
A calmaria que simples enobrece

Ainda me perguntam se ando doente
E tento ser um pouco mais coerente
“É só a alma que treme quando minha moça aparece”

domingo, 5 de junho de 2011

Conselho-regra de quem tem sofá vermelho

"Esquece, cara, não é assim! Não tem hora pra fazer sexo, tem sexo pra fazer hora. Depois de acordar é melhor, óbvio, mas você sempre acaba não sabendo se é noite ou dia. Então pronto, fica tranquilo que ela ainda não chegou e o céu nem escureceu."